Artur Alonso Artur Alonso
“Mãe Primordial, “Senhora de todos os povos“- Dizem que a germinação só acontece sob a terra, ao abrigo de todos os ventos e de todas as luzes múltiplas” (várias leituras que permitiram esta composição livre)
Para situar a obra feita por Prisciliano, e a semente deitada, na fértil terra Galaica e Lusitana, começaremos primeiro por falar dos Essênios. Estas comunidades, que segundo alguns estudiosos, não somente viviam no Qumran, senão que inclusive poderiam ter-se espalhado ou mesmo ter sido originarias do Egito, têm muito a ver com o pensamento gnóstico e iniciático de todo o Ocidente.
Muito se especula do seu carácter messiânico e apocalíptico, de sua feitura de seita extremista auto-destrutiva – devido entre outras cousas, a má interpretação do famoso “Pergaminho ou Rolo da Guerra”, que foi descoberto, com alguns outros dos chamados “Manuscritos do Mar Morto”.
No entanto, também foram encontrados outros pergaminhos, onde ficavam ao descoberto, as normas ou regras, de carácter igualitário e fraterno, nas que era baseado o convívio de ditas comunidades. E isso era precisamente o que os Essênios praticavam, um comunismo espiritual. Comunismo – no sentido de comunhão com um mesmo, dentro duma comunidade, e dizer dentro duma comum unidade. Segundo referendam autores contemporâneos, como o mesmo judeu romanizado Flávio Josefo, em suas crónicas ou livros, sobre a Historia dos Judeus.
Conhecedores das ciências iniciáticas das Idades: como a Geometria Sagrada, Astronomia e Astrologia, são apresentados comummente como grandes sanadores, vegetarianos (contrários a qualquer tipo de sacrifícios de animais…) Despegados de toda materialidade (sem nenhum tipo de propriedade privada), compartilhando os bens em comum, vivendo em reciproca igualdade de homens e mulheres (conhecedores da complementar ação dos muitas vezes visionados como falsos opostos)… Os essênios viviam em harmonia com a natureza, praticando a ecologia ativa e a ajuda mutua, que apenas a finais do século XIX, deu forma o investigador russo Piotr Kropotkin. Essas normas de convívio, eram organizadas, por meio, duma hierarquia de tipo evolucional – onde as pessoas que atingiam um nível mais elevado de conhecimento (ético, moral e erudito) ocupavam os postos de governo, enquanto outros membros da comunidade, revezavam-se se, dentro dos diferentes trabalhos a realizar (no aprendizado do seu aperfeiçoamento interior, com total liberdade de escolha segundo suas aptidões). Uma espécie de Sinarquia, tal vez superior, àqulea teorizada pelo mesmo Saint-Yves d´Alveydre. Logicamente, embrenhados nesta vivencia harmoniosa, nenhum membro da comunidade, podia exercer o papel de educador sem antes ter demonstrado uma integridade ética avaliada. Doutores, doutoras, “Mestre de Justiça” eram guias, e não doutrinadores do resto dos seus irmãos e irmãs. Seus aprendizagens eram de tipo vivencial, e não somente teórico, pratico, como hoje ainda o entendemos.
Os primeiros cristãos, foram fortemente influenciados pelas doutrinas dos essênios (mesmo com grande possibilidade de ter entre sua filas, tanto antigos essênios como nazaritas). Influenciados também da filosofia messiânica, que também desaguou no famoso “Apocalipse” de São João. Muitos acham que Yeshua Ben Pandira, o Mestre Nazarita, e Maria de Migdala, ou Madalena, a genuína representante do sacerdócio feminino (guardiã da Chama Sagrada da Divindade Feminina), teriam tido intensa e fluida relação com estas comunidades.
Ate o 303 d. C. Todas as comunidades cristãs bebiam dalgum modo das fontes essênias e nazaritas (sendo Jesus o nazareno, originário dos segundos – daí seu sobre-nome). Mas em esse ano, de 303, começa a troca desse cristianismo primitivo, muito ligado ao mundo judeu, e mais concretamente aos judeus helenizados, como os de Alexandria; por parte dos poderes mais achegados a Roma. Foi nesse ano, segundo o autor Fernando Conde Torrens, que Constantino junto a Lactancio, começam a criar as raízes das atuais religiões, baseadas na figura do Cristo. Mais tarde, no 325 no Concilio de Niceia, já foram institucionalizados o atuais evangelhos canónicos. Estudos efetuados pelo erudito catalão Llogari Pujol, monstram, que os três evangelhos sinópticos, foram copiados, modificados ou interpolados, por relatos egípcios, como o texto das Pirâmides. Afirmando que a figura de Si-Osiris, fora subsistida pela de Jesus Cristo, mantendo a narrativa fel ao relato original. Deste modo foi arquitetado o edifício religioso, que permitiria ao Império romano, dotar-se duma nova coesão interna, em tempos muito revoltos.
Niceia, também foi a base, para retirar de cena, todo referente feminino, afastando toda realização do poder espiritual da mulher, ao retirar-lhe a figura do sacerdócio correspondente. Autores, como José Luis Gimenez, Michael Haag ou Jennifer Ristine (diretora do Museu Magdala), apontam a ideia de apagar a figura de Maria Madalena tem a ver, com esse retirar o poder feminino (tal como confirmam os evangelhos apócrifos de Tomas, Filipe ou da própria Maria de Migdala), submetendo a vontade as mulheres ao Poder Patriarcal. Para cujo fim era preciso ocultar aquele sacerdócio, relacionado com os segredos da Mãe Terra e da Mãe Cósmica (2ª na trindade oficial, de praticamente todas as cosmogonias). Fato, que ficou definitivamente ancorado no dogma cristão, quando o Papa Gregorio I, no 21 de setembro de 521, numa homilia na Basílica de São Clemente, em Roma, converteu a companheira de Yeshua, numa vulgar prostituta. Distorcendo um episódio do evangelho de Lucas, que claramente fazia referencia a Maria de Betânia.
Existem muitas hipóteses, da chegada à Galia, de Maria Madalena, junto três companheiras, fugindo das perseguições na Palestina, após a crucifixão; aportando as três à vila costeira de “Saintes-Maries-de-la-Mer”. Trazendo a Europa, ainda romana, celta e germana, o saber oculto feminino, que sem duvida seria misturado, com os cultos europeus ainda vivos, da Soberania Feminina, fortemente enraizadas, entre outras na ancestral tradição celta da Galias.
Em 370 Prisciliano viaja a Burdigala (atual Burdéus) onde estuda com o retórico Delphidius, e com sua esposa Eucrócia (junto a qual vai fundar uma comunidade gnóstica, perto desta cidade). Segundo Itácio de Ossónoba (hoje cidade de Faro, no Algarve) Prisciliano também estudou astrologia e alta magia com o Mestre Marco Mênfis… Sendo pois, não muito dificil, de imaginar que aquela gnose transmitida pelos essênios, chegou desde a Gália a Gallaecia e Lusitania, por meio deste nosso gnóstico galaico, que chegou a ser bispo de Ávila. Segundo outros dos seus detratores, Paulo Orósio, da Bracara Augusta (Braga), o herético Prisciliano ensinava que os nomes dos Patriarcas correspondiam às partes da alma, enquanto os signos zodiacais corresponder-se-iam com os diferentes órgãos do corpo humano. Segundo Anne e Daniel Meurois – Givaudan, os essênios praticavam um tipo de meditação, em certos dias da semana, onde ligavam certos órgãos do corpo, a determinados planetas (com os quais estes órgãos se relacionavam), como um modo de sanação coletiva e individual.
Do mesmo jeito, a tradição gnostica da sacerdotisa feminina, ia ser entrelaçada também na Gallaecia, com o conhecimento ancestral da Deidade feminina.
Fato, que ficou totalmente patente quando as comunidades priscilianistas recuperaram o sacerdócio feminino, junto a ideia de comunidade fraterna em igualdade; organizada duma forma sinárquica, oito séculos antes dos cátaros fazer mais permanente, no tempo, este tipo de libertadoras experiências.
Muito possível também estas comunidades, tanto na Galia como na Gallaecia, beberam do gnosticismo siríaco-egípcio, de raiz essênia, muito influenciados ambos pelo pensamento platónico e pitagórico. Tendo em conta que aquela região mediterrânica, teve fortes relacionamentos com a Península Helénica e, por tanto, com o seu pensamento mais avançado. Não era de estranhar, os essênios, também serem rotulados de helenizados. Assim como conhecidos popularmente como os “Filhos do Sol”, epíteto que entronca com o pensamento egípcio de Aton – e o farão Akenaton, do qual muitos analistas acham Pitágoras, continuador; assim como dos princípios herméticos, do também egípcio Hermes Trismegistus ou o três vezes grande. Este pensamento gnóstico Sírico-Egípcio, matem a ideia da criação como um serie de emanações, provindas, duma fonte monádica primordial, resultando finalmente numa cristalização material, através da densificação da energia , plano a plano. Algo condizente também com a visão cabalística da árvore da vida, e, suas simbólicas esferas shefiróticas. Promanar do espiritual: descida da monada na matéria. Para finalmente, trás múltiplas encarnações e diversas experiências, produzir-se a sublimação: subida da monada ao plano espiritual (a volta do filho pródigo ao palácio do Pai, segundo os hebreus; o regresso do filho pródigo, segundo os cristãos). Desde o ponto de vista da Alquimia: quadratura do círculo, como símbolo da descida da monada na matéria; circulação quadrado como subida da monada ao plano espiritual.
Não se pode descartar que Prisciliano trouxe-se da Gália, também consigo, alem deste saber milenar, também o conhecimento do famoso “Rolo da Guerra”, e aquela visão messiânica do trunfo da luz sobre as trevas.
Naquele pergaminho os essênios faziam referencia, entre outros entes escuros a derrotar, aos adoradores de Amon. Foram precisamente aqueles sacerdotes de Amon, os encarregues de conspirar e, finalmente, derrotar Akenaton; assim como substituir o nome do seguinte farão Tutancaton, pelo de Tutacâmon.
Isso explicaria com facilidade, a terrível repressão ao movimento priscilianista, e a tortura, e posterior condena a morte do próprio Prisciliano, com 7 dos seus seguidores, decretada no Concilio de Tréveris, em 385. Onde seria condenado pelo uso de herbáceas, práticas abortivas, rituais noturnos… O qual segue plenamente a condizer com as praticas das comunidades essênias: uso da medicina natural, rituais coletivos de ampliação da consciência, etc.
Sem duvida, Prisciliano, representava uma grande ameaça para aqueles sacerdotes romanos, mais perto das doutrinas de Amon, que das de Aton. Essas doutrinas de Aton, o brilhante Sol Oculto – Criador, não deixam de entroncar também com os conhecimentos de Zoroastro – ou Zero Astro, Astro Zero – Sol Interior, dos antigos Persas; assim como as aprendizagens da Índia védica. Conhecimentos que desde a versão de Édouard Schuré, no seu livro “Os Grandes Iniciados”, foram levados pelo celta Ram (que na Índia seria nomeado de Rama, heroi do Ramayana), ao Oriente fértil. Pensamento, que de algum modo, nos nosso dias, desse Oriente Lux vem retornado agora, até o novo Ocidente Lux.
Tendo em conta, que nessa altura, o Império Romano, tinha recebido também migrações de famílias tanto do Império Parto – Iraniano, como da Síria helenizada. Sem esquecer que o culto a Mitra, era muito estendido entre próprias as legiões romanas, e desse mesmo culto ainda prevalece muito na atual liturgia católica.
De jeito que não é de estranhar que todo esse pensamento se tenha fundido na gnose cristã – e nos cultos ao sol interior crístico, que tem grandes similitudes, com a guia ou caminho solar do Deus Celta Lugh: símbolo do descobrimento do poder interior.
Dai, não ser muito louco inferir que nosso bispo Prisciliano, teria sido um adiantado mais em plantar essa semente, que trazer-ia finalmente, para o Ocidente materialista, um novo brilho cientifico – espiritual, para uma Nova Era. Era que está a começar para finalmente realizar aquela mudança real, da Consciência, em face duma Nova Humanidade.